Aqui Estou
Aqui Estou
Aqui estou,
no encontro dos caminhos
no sítio onde os olhares se dobram de terror...
Quando a minha voz disse não e a vontade e o espelho
havia acordo e sonho e flores para abrir.
Quando as minhas mãos escorriam de ternura
havia liberdade e os meus pés descalços
recortavam em sombra a única lisura.
Que lindo o que eu sonhei,
que paz e que mistério
que grande força sem lágrimas no mar...
Agora estou dorida,
morreram-me os cabelos
nos dedos que pediam caiu uma agonia,
as cordas já cortadas tornaram a me ligar.
Na noite que me seque eu quisera sorver
toda a ausência direta do possuir e do ter,
fugida na floresta escondida na giesta
morder aquela terra fecunda em que me sei.
Sem luta, a navegar,
um barco branco e meu
sem timoneiro nem rota marcando-me o destino
singrando sob a lua,
bebendo o sol dos dias
tão só e o grande olhar de Deus,
deitado ao pé de mim.
Assim correr, ser livre, criar e ter prazer
aquele só prazer igual ao que já sou
uma lira, um canto, uma harmonia enfim
serena,
bela,
doce e sem violência louca.
Idade duma rosa colhida na manhã
vibrando no calor as pétalas a abrir
surpresa vegetal da vida que se inflama
com o caule cortado e sem poder sorrir.
Quem livre me deixasse dormir na minha planta
este acordo supremo dos membros do amor,
sem traição,
sem corte,
e só aquele manso
sorver da terra a seiva para poder florir.
Ai,
mar em que me banho e que livre me deixas
miragem do meu ritmo,
partida para além
meu doce só saber braços,
pernas,
seios,
beijos,
e toda a maravilha de ser sem mais ninguém.
Salette Tavares
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